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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

RAIO X: “FOGO... CORRE... A LOJA DE SEU NEMÉSIO TÁ PEGANDO FOGO” - PARTE I

A HISTÓRIA DE UM INCÊNDIO EM ARATUBA, SEU IMPACTO APOCALIPTICO, O CONTEXTO POLÍTICO-SOCIAL E AS LIÇÕES DE VIDA. 


A HISTÓRIA DE UM INCÊNDIO EM ARATUBA
“Corri da residência de minha tia até a casa da Albaniza Mariano com minha filha Rebeka nos braços, quando vi as labaredas de fogo na loja”. (Alígia Maria Alves Medina Diniz, 50 anos, na época com 24 anos).

“Eu vi o pessoal correndo, uns levando os bojão de gás para o campo. Os bojãos vinham das casas da vila, das casas mais próximas, levaram tudo pro campo por causa que era o canto mais aberto e para não explodir pois o fogo era muito alto e a negrada dizia que o fogo tava incendiando a manga, mas no caso o fogo era só na loja. E era na época do verão e o capim tava tudo seco, qualquer faísca era fatal. Eu tava no campo lá. Muita gente no campo tinha de 300 a 400 pessoas. De bojão parecia um depósito de gás, tudo arrudiado no campo e no meio do campo, os bojãos tudim e as pessoas rezando na parede da quadra lá porque o mundo iria se acabar”.(José Ednaldo Lima Silva, 39 anos, na época tinha 13 anos).

“Levei minha irmã nos ombros enquanto minha mãe nos conduzia até a piscina do Camará onde já havia muita gente dentro com medo do fogo” (Edson Moura Martins, 34 anos na época com 08 anos).

1986. É o ano da passagem do cometa de Halley e alguns viam nisso um sinal apocalíptico catastrófico. Mas em Aratuba o “apocalipse” não veio em junho na passagem do cometa, mas em novembro perto das 07:00 horas da noite. Tudo indica que era uma sexta-feira. A maioria das pessoas estavam em suas casas. Durante a tarde faltara energia chegando apenas no início da noite e como a maior parte das casas em Aratuba não possuíam televisão era comum as pessoas se reuniram nas residências de amigos e vizinhos para assistirem a novela do momento. Porém abruptamente todos foram interrompidos pelas vozes que gritavam nas ruas: Fogo, Fogo... à Loja de Seu Nemésio tá pegando fogo.” Imediatamente começou um pânico, medo e  correria por todos os lados, menos em direção à Rua Júlio Pereira, entrada da cidade onde acontecera o incêndio que crescia rápido e assustadoramente. Naquela noite o ônibus da empresa Pinheiro que fazia a linha Aratuba-Fortaleza, passando por Palmácia ficou num primeiro momento próximo ao comércio do Sr. José Eduardo. Entre os passageiros do ônibus estava o casal dono da loja, Nemésio Lima e sua esposa, Dona Consuelo. Benício Gomes Lima (o Mudo), filho do casal entra no ônibus e quando o mesmo resolver entra na cidade ele fica tapando a visão de sua mãe, Dona Consuelo, que percebe logo tudo que está acontecendo. Seu Nemésio ficou muito triste ao ver anos de trabalho seu e de seu pai serem destruídos pelas chamas. Segundo, Auxiliadora Batista (Tirica), sua mãe simplesmente disse: “Deus permitiu. Ele sabe o que faz. Ele tudo providenciará”.
José Adriano dos Santos Martins (Zezinho), filho adotivo do casal Némesio e Consuelo desde os 11 anos, na época com 21 e balconista da loja vinha descendo pela rua com uma amiga quando ouviu o alvoroço dos populares e correu até sua residência para buscar as chaves da loja e abri-la na tentativa de conter o incêndio. Os vizinhos jogavam latas de água para apagar o fogo que aumentava em proporções gigantescas ao ponto de queimar as folhas dos altos pés de eucaliptos da Família Pereira. Sua força era alimentada pelos materiais inflamáveis dentro da loja como tecido, latas de querosene, sacarias, muito arroz, café, açúcar sem contar com dois forros de madeira. O incêndio não foi criminoso como ficou constatado posteriormente. Resultado do atraso em mudar uma fiação velha que acabou por causar uma tragédia histórica que trouxe conseqüências sociais, econômicas e psicológicas à população urbana de Aratuba, principalmente, é claro, a família Lima. 
As histórias contadas hoje, 26 anos depois, são até hilariantes, mas na época não havia graça nenhuma, nada de risos, tudo se resumia em medo, pânico, corre-corre e gritaria. A cidade inteira ficou num clima apocalíptico como se o fim do mundo tivesse chegado.


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